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quinta-feira, maio 26, 2016

Era confusão



Acordou mais cedo que o normal - na verdade, há bastante tempo não dormia noites inteiras - e enrolou um pouco para levantar. Abriu a cortina e viu a cidade imersa em um mar de neblina branca que quase não deixava identificar onde eram montanhas e onde era céu. Passou pelo banheiro e foi na cozinha. Se movia com uma delicadeza de quem não se importava em se atrapalhar. As mãos, quase como uma dança, se esticavam, retraíam, giravam e então paralisavam. Encheu o bule de água e ficou ali, encostada no vão da porta, esperando que a chama lenta e azul do fogão fizesse a água borbulhar. O barulho do filete de café caindo pela garrafa, o aroma inundando a casa e a manhã já não parecia mais tão solitária.

Hoje ela decidiu não fazer nada. Se sentou no sofá quase como quem estava em estado de êxtase. Com uma xícara quente de café nas mãos se pegou olhando para o nada. E assim ficou. Ficou. Ficou. Ficou. E ficou até que sentiu a alma se enchendo, até que o sofrimento foi apagado, até que os cortes nos dedos cicatrizassem, até que a saudade não era mais confundida com amor, até que se perdoasse por deixar os outros a machucarem, até que aceitasse que a culpa nem sempre é sua.

E foi assim, como quem brinca de poesia com o dia a dia, que ela descobriu que com o tempo a dor é lembrada com menor intensidade e que é melhor sofrer um pouco quando termina do que sentir uma pontinha de culpa todos os dias.


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