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quinta-feira, novembro 17, 2011

Latas de amor.


Dias atrás acordei destinado a achar meu rumo. Sorri para a menina que encontrava-se deitada ao meu lado. "Qual era mesmo o nome dela?" Pensei enquanto calçava minhas meias pretas. Peguei meu casaco que estava jogado em um canto qualquer daquele quarto desconhecido por minhas vistas. Ajeitei o cabelo no espelho da sala, saí daquele lugar, desci as escadas. Com a cabeça ainda dolorida da vodca exagerada na noite passada, fui para casa. Joguei as chaves sobre a mesa, entrei na cozinha como quem procurava por alguém em especial. Não encontrei ninguém. O café de ontem ainda estava sobre a pia. Entrei no banho, encostei-me na parede enquanto a água descia pela minha nuca. Deitei na cama e dormi. Ao acordar lavei o rosto e fui me sentar na praça do outro lado da rua. Ver o movimento da rua, sei lá, esfriar os pensamentos. Avistei um homem catador de latinhas virando a esquina. Uma das sacolas que ele carregava arrebentou, espalhando todo o seu conteúdo pela rua. Ligeiramente o mesmo se desesperou em catá-las. Intrigou-me ver todas aquelas pessoas passando por ele sem ajudá-lo. Levantei do banco, ajudei. O homem parecia surpreso por tal ajuda. Agradeceu-me. Ambos viramos as costas para seguir nossos rumos, porém algo me dizia sobre o cansaço que ele não estaria sentindo. Olhei-o novamente nos olhos:
-Aceita um café?
-Ô meu filho, aceito sim. Trabalhar é difícil depois que a idade lhe toma.
Fui até a padaria, comprei alguns sanduíches e um copo de café. Sentei-me ao seu lado enquanto o senhor devorava o lanche. 
- É difícil achar alguém com um bom coração assim ultimamente. - Ele me disse.
Surpreendi-me, afinal eu podia ser tudo, menos de bom coração. Alguém de bom coração não trocaria de mulher todas as noites, não se jogaria na vida como eu.
- Quem me dera. -Respondi baixinho.
-Como assim "quem me dera"? Ninguém com um mau coração estaria fazendo tudo isso por outra pessoa que nunca viu.
Sorri e abaixei a cabeça. Conversamos mais um pouco, ele me contou um pouco sobre sua vida:
-Costumava ser um médico renomeado, arrogante, casado, apaixonado por minha esposa e minha filha. Infelizmente, Deus tirou-as de mim em um acidente de carro anos atrás. Desde então me perdi na vida.
-Mas você foi feliz? -questionei-o.
-Tenho meus arrependimentos, como nunca mais ter visto minha mãe após uma briga, mas posso dizer-lhe que sim.
-Então é isso que conta.
-Mas e você, garoto, é feliz com sua vida?
-Sou. -respondi após um longo tempo pensando.
-Certeza?
-Sou arrependido também.
-Pelo que?
-Por ter deixado a garota que mais me fez bem partir.
-Ela é única?
-É, ô se é.
-Então o que esta fazendo aqui conversando com esse velho? -O mesmo sorriu.- Vai lá, corre.
-Quer saber? Eu vou. Obrigado por tudo. Foi um prazer conhecê-lo.
Me perdi virando a esquina. Entrei em casa, juntei algumas mudas de roupas e fui para a rodoviária. Comecei a ver a paisagem urbana se desfazendo. Desci naquela cidadezinha que havia deixado para trás a tanto tempo. Fui até sua casa, bati na porta. O coração pulava, queria ir embora, não fui. Ela atendeu:
-Oi?
-Oi. Tudo bem?
-Tudo indo. E você?
-Tudo horrível sem sua companhia.
-Porque foi embora então?
-Porque eu odiava esse lugar. Agora odeio ficar sem ele.
Ela riu.
-Você é um idiota indeciso.
-Sou o seu idiota. Me desculpa?
-Claro.
-Eu te amo. -Beijei-a.
Acabo me encontrando hoje nessa janela antiga de madeira, preparando-me para meu casamento. Ignorei a parte da vida que dizia para não se apegar. Ignorei qualquer coisa sobre os males que o amor podia te causar. Fechei a janela e fui me casar.

domingo, novembro 13, 2011

Vento na janela.


          Sentava-se a beira da janela naquela noite de tempestade, a chuva, o vento, os relâmpagos tocavam o vidro, o sorriso refletia-se sem sentido. Saudade dominava o peito. A sonhadora menina apaixonava-se cada dia mais pelo garoto do sorriso sincero. Recordava-se da história, de tudo que se passou em quase dois anos. E lembrava da primeira vez que ouviu falar do tal menino e de que mesmo sem conhecê-lo, mesmo com um tempero de ciúmes por ter conquistado aquele por quem tinha uma enorme simpatia, acalmou-se e ajudou-o indiretamente naquela noite. Trechos da conversa vêm à sua mente. Seu desespero, que tomou-lhe conta pela tal alma que até poucos minutos desconhecia a existência, voltava ao peito. E desde aquele momento sentiu algo forte, só não sabia se era algo bom ou ruim. Com o tempo o sentimento começava a tomar forma, a fez segurar firme sua mão sempre que foi preciso. A fez voltar atrás de todas as discussões. Hoje sorria sozinha ao perceber as linhas tortas que escreveram o amor em suas veias. Suspirava profundamente ao observar sua fotografia. Ainda não compreendia como poderia existir na vida sentimento tão forte capaz de lhe fazer perceber quando ele perdia-se afrontado em seus pensamentos. Desistia dessa reflexão complexa, pegava o celular:
          - Alô? - Ele atendeu.
          - Oi, me desculpa?
          - Pelo que?
          - Por não ter lhe dito o quanto você me faz bem.
          O silêncio dominou o telefonema.
          - Tô indo ae, me espera. -Ela continuou.
          Interfone chamou, a chuva não dava trégua. Ele abriu a porta, saiu debaixo do temporal. Encontrou em meio a tanta água que caia do céu, encontrado em tonalidade alaranjada, o calor de um abraço firme seguido por:
           - Eu te amo. Senti saudades.
          Ele sorriu. Daquela maneira que só ele sabia sorrir. Beijou-a e disse com um jeito de quem fingia não se preocupar:
           - Entra vai, troca de roupa, você vai gripar.
          E assim ficaram lá, tomando café, rindo de suas próprias bobagens, matando as saudades que a vida insistia em colocar entre os dois. Ainda não sei muito bem se tudo isso daria mesmo certo, mas havia de dar. Existia amor e isto bastava para trazer-lhes um sorriso essa noite.